sábado, 26 de julho de 2008

Namastê?




Em sânscrito: "O Deus que há em mim sauda o Deus que há em ti". Foi com estas palavras que fui recebida num restaurante indiano em São Paulo, o Tandoor. Eu já tinha ouvido falar (bem) do lugar. Esperava uma coisa talvez um pouco mais chique, ou mais arrumadinha. Até ai, tudo bem. Não precisa ser chique para ser bom. Estava feliz com a escolha por ser um programa diferente e por me lembrar os tantos indianos em que comi recentemente na Europa (principalmente em Berlim). Ótimos indianos nada chiques em que me deliciei por pouquíssimos euros.

Ao sentar na mesa reparei no pé direito, um pouco baixo pro meu gosto. É que tenho uma combinação de claustrofobia com agorafobia que me faz querer sempre locais amplos e sem muita gente, pros lados e pro alto. Deve ser o Deus que há em mim... Outra coisa: a iluminação. Não gosto de locais muito claros mas achei um pouco escuro demais, ou talvez seja o tom das lâmpadas, não sei. Vou perguntar à amiga iluminadora que estava comigo o que é que tinha na luz que me deu tanto sono. Até ai, tudo bem. Companhia boa, conversa boa, tudo certo.

Pedimos como entrada uma porção de samossas de legumes, um pão com alho e uma tortilha de milho com vinagrete e coentro. Tudo legal. As samossas um pouco sem graça. Aquele gosto onde predomina a pimenta e os outros sabores ficam meio duvidosos. Pro meu paladar fica faltando uma certa acidez ou... não sei. Mas às vezes na comida dita indiana, sinto que os sabores são "mornos", não ativam certas regiões do meu paladar e não fico satisfeita. Não sei. Muito subjetivo?

Junto com a entrada um conjunto de três molhos. Chutney (acho que de tomate), algo marrom escuro indefinível e algo marrom claro que estava com um gosto bem estranho. A minha amiga achou que estava azedo. Eu não provei, mas mexi com a colher. Onde já se viu um molho frio borbulhar? Pois esse molho borbulhava e pedimos para levar embora. Torcemos o nariz.

Bom, vamos aos principais. Não estavamos com muita fome então pedimos dois pratos para dividir. Se fosse pouco pediriamos mais. Um carneiro "marinado no rico molho de iogurte", grelhado no espetinho. Estava bom, um pouco ressecado, o queimadinho da brasa era um ponto a favor, o iogurte era imperceptível. Com limão melhorava. Uma beringela cozida com tomate e outras coisas, quase na forma de um creme. Não reconheci muito a beringela (só as sementinhas na boca), porque novamente tinha aquela pimenta, o mesmo sabor "morno" das samossas, nada muito instigante. Mas estava bom, vai. Até que uma das pessoas na mesa, ao dar uma garfada, encontrou um objeto desagradável. Sabe quando você corta com a tesoura uma embalagem tetra pack? Aquele triangulinho da ponta? Pois tinha um pedaço de embalagem na comida. Reclamamos com o garçom, que levou o pedacinho embora sem falar uma palavra.

Desconforto geral, mas comemos até o fim. Como sobremesa um arroz doce bastante místico, que pro meu gosto tinha cravo demais. Mas era interessante, servido quente. Um café "Brik" carioca, bom, e a conta.

Eu esperava que o prato que veio com pedaços de embalagem não fosse cobrado. Todos esperavamos isso. Mas foi cobrado e não só isso. O garçom não trouxe o troco do pagamento da conta. Era pouca coisa, dois reais no máximo. Mas eles não trouxeram. Então minha amiga suiça, que é dessas pessoas que não tem medo de se indispôr para fazer valer um direito, reclamou. O garçom trouxe dez reais de troco, como se isso compensasse os descuidos todos.

Um verdadeiro desastre gastronômico! Um mico! Problemas sanitários sérios, algo inadmissível. Nunca mais volto nesse lugar e não recomendo. Uma pena. Ter sido atendidas e servidas dessa maneira, me leva a pensar naquele "Namastê" na entrada. Aquela coisa do Deus em mim e tal. Você imagina uma conexão com o sagrado na pessoa que se curva para te comprimentar, humildade, dignidade. Aquela coisa yoga, ayurveda, doshas, purificação, desapego, iluminação. Uma fantasia ocidental? Não sei, mas nesse caso é mentira, é só uma cena. Pra mim o que ficou foi molho fermentado e tetra pack na beringela.

...

(ainda bem que hoje jantei um queijo burrata da puglia, orechieti com bacalhau e um malbec argentino maravilhoso, no Pasquale, ufa!)

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Miojo

Eu gosto de miojo.
É incrivelmente prático.
Mas dispenso os molhos de envelopinho que vem junto.
Tenho aversão a glutamato monossódico. O tal aji-no-moto.
Ainda que em algumas ocasiões o ingira como parte integrante das comidas de pacotinho.
Outro dia, por exemplo, comi uma batata frita sabor frango assado.
Até saber que era "sabor frango assado" estava achando bom. A consciência do sabor (artificial, exagerado, acentuado pelo vilão glutamato) me fez sentir como se estivesse bebendo uma televisão de cachorro.
Claro, frango de padaria pode ser muito bom. Mas isso é outro capítulo.
Voltando ao miojo.
Às vezes como só, com azeite, parmesão e sal com ervas.
Às vezes só lemon & herbs.
Azeite sempre.
E também gosto de incrementar com ervilhas frescas, cogumelos, pedacinhos de abóbora, beringela. Qualquer coisa rapidamente refogada com um pouquinho de alho.
Ontem caprichei. Fiz um refogadinho com lombo de porco defumado (que sobrou de uma sopa de cenoura), cogumelos paris frescos, espinafre e tomate cereja. No auge da friturinha um pouco de vinho branco, deixa reduzir, um fio de creme de leite fresco, tampa, desliga o fogo, coa o miojo, joga o molho em cima, um fio de azeite extra virgem, parmesão.
Tudo pronto em exatos 5 minutos.
Comi na frente da TV, assitindo um capitulo velho de Smallville, entre um trabalho e outro.
Gosto de fazer isso.
Adoro miojo.
Mas dispenso os molhos de envelopinho que vem junto.

sábado, 12 de julho de 2008

Ici Bistrô (ou a importância de se fazer reserva)

De noite também é lindo.



Noite dessas, depois de trabalhar durante horas numa trilha sonora com uma amiga, resolvemos sair para comer "uma coisa leve e gostosa". Mas onde? Sexta-feira à noite, Vila Madalena já lotada. Preguiça de dirigir, de estacionar, de escolher, de pensar. Então, num insight eu disse "já sei!" e veio o uníssono "Ici!". É bom concordar assim, de livre e instantânea vontade.

Pegamos felizes o rumo de Higienópolis, pela Sumaré vazia. Chegamos, tinha uma vaga quase em frente (às vezes tenho vergonha de chegar na porta dos restaurantes com meu carro velho e sujo, mesmo que estas mesmas caractéristicas componham em outras situações o charme e extravagância de uma cantora com óculos de aro beige). Ao entrar, o que era de se esperar (literalmente), cheio. Como só tinha um casal esperando resolvemos sentar e tomar alguma coisa enquanto nossa mesa (fumantes? tanto faz!) vagava.

Mas quem vai ter vontade de sair rápidamente do ambiente acolhedor do Ici Bistrô? A iluminação é uma delicia, num tom âmbar suave que nos deixa mais bonitos mas não impede o enxergar da comida (é estranho comer sem saber do que se trata). A acústica boa, se pode conversar tranquilamente, sem cacofonia nem tumulto, musica suave bem escolhida, "what a difference a day makes?". O serviço é ótimo, sem frescura. A sommelière, que nós conhecemos de outros carnavais menos franceses, nos explicou tudo que não sabiamos sobre a uva tannat. A hostess foi sincera quanto à duração da demora, os garçons atenciosos, daqueles que sabem te deixar em paz mas não somem.


Coisa linda.


Por esses e outros motivos, como o desfile de pratos lindos como o de cima saindo da cozinha, esperamos aproximadamente uma hora. Tomando um vinho francês tannat-merlot, água com gás e couvert: pasteizinhos de carne recém feitos, quentes e crocantes, pão frances, pão de cebola, manteiga, queijo de cabra e um maravilhoso e simples patezinho de beringela. Mas comemos tanto que quando chegou a mesa estavamos um pouco altas e sem fome.

Por isso pedimos duas meias-porções de risoto trufado de cogumelos. Adoro risoto, adoro cogumelos, adoro o aroma de trufa em pratos brancos. Então apareceu o Benny, chef e proprietário da casa (que nos ouve e nos lê, que honra!) e nos presenteou com um prato dos deuses. Cassoulet de frutos do mar! Servido numa mini panelinha Le Creuset, cheirosa e borbulhante. Minúsculos e macios anéis de lula, pequenos e saborosos mexilhões, vieiras grelhadas antes de ir pro ensopado (que maravilha), e camarão (ou era lagostim?). Tudo no molho de tomate, feijão branco, caldo do cozimento, sabor suino, temperos. Uma delicia! Belíssimo presente.

Para harmonizar a sommelier trouxe um outro vinho, um jerez branco cheio de personalidade. Foi difícil tomar com o paladar já contaminado pelo tinto. Tinha um aroma muito forte, que lembrava acetona e bastante acidez. Preciso de mais referência e educação enológica para apreciar este tipo de vinho. Mas provei e achei interessante.

A essa altura, passado o cassoulet, o que fazer com os risotos? Odeio desperdício, odeio pedir comida demais, odeio comer algo delicioso sem a devida fome. Por sorte, deu tempo de cancelar e o garçom não olhou feio nem criou caso. Tentamos terminar o vinho (não conseguimos, somos peixes pequenos), mas terminamos a água e saimos felizes, sem ter provado nenhum dos maravilhosos pratos do cardápio nem as sobremesas que passavam sedutoras ao nosso lado (ainda vou precisar daquele creme brulee).

Da próxima vez, fazer reserva. Faça reserva. Ou então, arrisque, e talvez tudo conspire em favor da sua felicidade.


ICI Bistrot
Rua Pará, 36
Higienópolis
3257-4064
www.icibistro.com.br